Atualização (setembro de 2025): O Ministério da Saúde lançou a nova Linha de Cuidado para o Transtorno do Espectro Autista (TEA), estruturando o fluxo de identificação, diagnóstico, intervenção precoce, reabilitação e apoio às famílias em todas as etapas do SUS — da atenção primária aos Centros Especializados em Reabilitação (CERs).
Resumo rápido (para quem precisa de resposta imediata)
O SUS passa a exigir triagem universal de sinais de TEA em todas as crianças entre 16 e 30 meses usando o M-Chat (já disponível na Caderneta Digital da Criança e no prontuário do e-SUS). A estratégia prioriza diagnóstico precoce, elaboração de Projeto Terapêutico Singular, ampliação de CERs, formação de profissionais e apoio a cuidadores. Investimento inicial: R$ 72 milhões na Rede de Cuidados à Pessoa com Deficiência.
Benefício central: reduzir o intervalo entre suspeita, intervenção e acesso a direitos, melhorando desenvolvimento social, comunicativo e adaptativo.
Por que o diagnóstico e a intervenção precoces são cruciais?
A identificação precoce de sinais de TEA permite:
- Iniciar intervenções baseadas em evidências antes mesmo do laudo definitivo.
- Orientar familiares sobre estímulos no ambiente domiciliar.
- Minimizar atrasos em linguagem, interação social e autonomia.
- Reduzir efeitos acumulados de barreiras ambientais e de acesso.
- Planejar suporte educacional e garantir direitos das famílias mais cedo.
Idade-alvo para triagem
- Faixa: 16 a 30 meses (≈ 1 ano e 4 meses a 2 anos e 6 meses).
- Instrumento: M-Chat (Modified Checklist for Autism in Toddlers) – questionário de triagem validado internacionalmente.
- Resultado da triagem:
- Risco baixo: manter vigilância do desenvolvimento.
- Risco moderado/alto: reaplicação e/ou encaminhamento para avaliação mais aprofundada.
Fluxo na Atenção Primária (exemplo simplificado)
- Consulta de puericultura → aplicação do M-Chat.
- Sinal de risco → escuta qualificada da família + orientação inicial.
- Encaminhamento quando necessário para:
- Avaliação especializada (neuropediatria, psiquiatria infantil, fonoaudiologia, psicologia).
- CER (para reabilitação e plano interdisciplinar).
- Criação de Projeto Terapêutico Singular (PTS) com metas funcionais.
- Monitoramento periódico + ajustes terapêuticos.
Projeto Terapêutico Singular (PTS) no TEA
O PTS deve ser:
- Individualizado e funcional (foco em participação social).
- Construído com a família (corresponsabilidade).
- Interdisciplinar (psicologia, fonoaudiologia, terapia ocupacional, fisioterapia, pediatria, assistência social, educação).
- Baseado em metas mensuráveis (ex: aumentar contato visual funcional, ampliar repertório comunicativo, reduzir barreiras sensoriais contextuais).
CER (Centros Especializados em Reabilitação) e Rede de Cuidados
Ampliação anunciada:
- 71 novos serviços habilitados na Rede de Cuidados à Pessoa com Deficiência.
- Reforço em infraestrutura, transporte sanitário e custeio.
- Expansão de modalidades terapêuticas (presencial, grupos, orientação a cuidadores).
- Integração com escolas e assistência social quando há barreiras educacionais ou socioeconômicas.
Apoio a cuidadores e famílias
Inclui:
- Grupos psicoeducativos (explicação sobre TEA e direitos).
- Treinamento de habilidades parentais (baseado em protocolos da OMS e intervenções naturalísticas).
- Orientações sobre estímulos cotidianos (rotina, brinquedos funcionais, interação responsiva).
- Encaminhamento para assistência social quando houver vulnerabilidade econômica.
- Informação sobre direitos: BPC/LOAS (quando aplicável), acessibilidade escolar, prioridade em serviços públicos.
Investimento anunciado
- Valor: R$ 72 milhões para fortalecer a Rede de Cuidados à Pessoa com Deficiência (RCPD).
- Prioridades:
- Habilitação de novos CERs.
- Transporte sanitário em regiões com grandes deslocamentos.
- Capacitação de profissionais da atenção básica e especializada.
Desafios e pontos de atenção
| Desafio | Risco | Mitigação recomendada |
|---|---|---|
| Desigualdade regional | Atraso no acesso a avaliação e terapias | Teleconsultoria, formação continuada, pactuação regional |
| Falta de profissionais qualificados | Triagens mal interpretadas | Protocolos padronizados + supervisão técnica |
| Filas para terapias | Perda de janela de intervenção | Uso de grupos + orientação domiciliar estruturada |
| Comunicação com famílias | Abandono ou frustração | Linguagem clara + materiais educativos acessíveis |
| Monitoramento de resultados | Falta de indicadores | Implantar painel com nº triagens, encaminhamentos, início de intervenção |
Indicadores que deveriam ser acompanhados (monitoramento e gestão)
- Número de crianças triadas vs população estimada 16–30 meses.
- Percentual de triagens com resultado de risco.
- Tempo médio entre triagem positiva e avaliação especializada.
- Tempo até início de intervenção precoce estruturada.
- Taxa de adesão familiar a programas de orientação.
- Cobertura territorial de CERs por 100 mil habitantes.
- Satisfação das famílias (pesquisas qualitativas).
- Evolução funcional (uso de instrumentos padronizados em marcos semestrais).
Reflexões para a comunidade e gestores
- Pais conhecem os marcos do desenvolvimento infantil?
- A unidade básica oferece escuta qualificada e continuidade?
- Barreiras principais no território: deslocamento? tempo de espera? custo indireto?
- O que ainda falta: grupos de apoio? formação docente? intersetorialidade com educação?
O que educadores e escolas podem fazer
- Observar sinais precoces (atipias de interação, comunicação, jogo simbólico).
- Registrar e comunicar à família sem rótulos precipitados.
- Ajustar ambiente sensorial (ruído, previsibilidade de rotina).
- Promover inclusão e abordagem colaborativa com saúde e família.
Direitos das famílias (pontos de orientação)
- Acesso universal a triagem e avaliação no SUS.
- Prioridade em filas de serviços de saúde (quando legislação municipal/estadual prevê).
- Possibilidade de solicitar avaliação multiprofissional para adaptações escolares.
- Benefício de Prestação Continuada (BPC) quando critérios socioeconômicos forem atendidos.
- Transporte sanitário em casos de deslocamento inviável.
Boas práticas de intervenção precoce (princípios gerais)
- Centradas na família e no cotidiano.
- Foco em funcionalidade e comunicação (incluindo comunicação alternativa quando necessário).
- Generalização em ambientes naturais (casa, escola, comunidade).
- Monitoramento sistemático (registro de evolução).
- Integração com educação infantil e rede de proteção social.
Riscos de implementação sem qualidade
- Aplicar M-Chat como checklist mecânico (sem explicação).
- Saturar famílias com termos técnicos e pouca orientação prática.
- Atrasar intervenção aguardando laudo formal fechado.
- Oferecer terapias não baseadas em evidência ou com promessa de “cura”.
- Ignorar necessidades de adolescentes e adultos com TEA (continuidade do cuidado ao longo da vida).
Perguntas Frequentes (FAQ)
O M-Chat é um diagnóstico?
Não. É um instrumento de triagem que aponta risco; o diagnóstico exige avaliação clínica detalhada.
E se a triagem der risco e a criança ainda estiver muito pequena?
Intervenções baseadas em estímulos responsivos e comunicação podem começar mesmo antes de um diagnóstico fechado.
Quem pode aplicar o M-Chat na Atenção Primária?
Profissionais de saúde capacitados (ex: enfermeiros, médicos, outros membros da equipe — conforme protocolos locais).
A família precisa “esperar” o laudo para estimular?
Não. Estímulos adequados e orientação parental podem começar imediatamente.
Há custo para a triagem no SUS?
Não. Faz parte da atenção integral.
O que é um Projeto Terapêutico Singular?
Plano interdisciplinar, personalizado e revisável, construído com a família, que define metas e estratégias de cuidado.







